LIVRO DA SEMANA
CONVERSANDO É QUE A GENTE SE ENTENDE
RIO - Nélson Cunha Mello é um "homem de sete instrumentos": ator, professor, estudioso da língua portuguesa e agora escritor. "Um belo dia", se pegou colecionando expressões populares, bordões e gírias daquelas que muita gente fala "a dar com pau" e às vezes nem se dá conta da origem ou mesmo do real significado do que disse.
Em dez anos de pesquisa, Cunha Mello sequer precisou ir "aonde Judas perdeu as botas" para compilar as dez mil expressões que fazem parte do seu "Conversando é que a gente se entende" (editora Leya), recém-lançado dicionário de expressões coloquiais brasileiras como as que aparecem entre aspas nesta reportagem.
Para encontrar palavras e ditados falados por todo o país, o autor incluiu em sua rotina rituais que iam desde a leitura "ao pé da letra" de jornais diários e revistas, a "ficar de olho vivo" com o que se falava na TV, no cinema, no teatro, nas ruas. Admitindo a indiscrição, ele até passou a prestar atenção nas conversas alheias, sempre "de orelha em pé".
- Minha maior fonte de pesquisa foi a imprensa: em todos os artigos, reportagens, colunas, até nos classificados é possível encontrar esse tipo de linguagem. Quando percebi isso, comecei a colecionar, a ficar "antenado", para usar uma expressão do livro, a qualquer coisa que aparecesse - brinca, cheio de bom humor.
Com toda essa minúcia, Nelson já reuniu cerca de 300 palavras para um próximo volume de seu divertido dicionário. Do primeiro, ficaram fora as expressões regionais, aquelas que só são usadas (e compreendidas) em algumas partes do Brasil. As mais pesadas também foram deixadas para trás ("apesar de ter muita expressão chula", avisa).
Em entrevista, Nelson derrete-se por sua obra de 510 páginas, cujo prefácio e apresentação são assinados pelo imortal Evanildo Bechara e pelo escritor e músico Nei Lopes. A contracapa é do colunista do GLOBO Joaquim Ferreira dos Santos.
- A expressão "muito barulho por nada", usada até pelas pessoas mais simples, saiu da peça homônima de Shakespeare. Muita gente que repete esse bordão jamais leu Shakespeare na vida, isso é fantástico.
Fora casos como esse, quase nada intrigou Nelson. Como a maioria das expressões já é de uso popular intenso, poucas eram as que ele não conhecia, como "fazer colher de pau e ainda bordar o cabo", que significa absolutamente a mesma coisa que "fazer coisas do arco-da-velha". Ou seja, praticar atos surpreendentes.
Para o autor, a consagração do trabalho que foi catalogar, reunir e dar significado a tantas expressões veio com o lançamento do livro, em um evento no Rio de Janeiro.
- Um rapaz inglês que reside no Brasil há pouco tempo me abordou e contou, com um sotaque fortíssimo, que estava comprando o livro pra aprender melhor o português. Agora ele vai poder entender o significado de muitas expressões que ouve no dia a dia.