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A leitura transformada

Além de lerem mais livros por ano, os gaúchos consomem mais jornais e transitam mais pela internet do que os brasileiros acima do Mampituba. A revelação está contida em pesquisa encomendada pelo governo federal

     Se é um dos Estados mais conhecidos por cultivar tradições, o Rio Grande do Sul também se mostra atento a novidades e ligado a transformações culturais. Na leitura de livros, os gaúchos se desviam pouco da baixa média nacional, mas na busca de informações em jornais e via internet a renda e a instrução acima da média garantem um perfil mais antenado aos habitantes do pampa.

     A pesquisa Hábitos de Informação e Formação de Opinião da População Brasileira mostra transformações consolidadas no acesso ao conhecimento no Estado e no país. Os dados indicam que a leitura ultrapassou de vez as fronteiras do papel para se acomodar em telas de computador, telefone ou aparelhos eletrônicos como Kindle e iPad.

     O levantamento foi realizado pela Meta Instituto de Pesquisas de Opinião para o governo federal, com base em 12 mil entrevistas no país. Uma das maiores diferenciações dos gaúchos em relação à média nacional se estabelece na leitura de jornais. No Estado, 71,6% dos 1.129 entrevistados declaram ter esse hábito, proporção que cai para 46,1% no país como um todo. Enquanto isso, 18,7% dos gaúchos afirmam ler livros diariamente, ante 17,4% no total.

     – Fatores como renda e instrução permitem ter acesso a computadores e criam certa cultura que induz a esse tipo de uso com maior frequência. O caráter socioeconômico da população do Rio Grande do Sul favorece também uma proporção maior do uso da internet – analisa Flávio Silveira, diretor-presidente da Meta e responsável técnico pela pesquisa.

     É a ampla amostragem da pesquisa, destaca Silveira, que permite abrir os dados por Estado. No Rio Grande do Sul, 48,3% dos ouvidos relatou utilizar a rede mundial todos os dias, enquanto na média do país o percentual ficou em 43,9%. Os dados chancelam a interpretação de Silveira: na classe de renda familiar acima de 10 salários mínimos mensais, o acesso à internet quase dobra, para 79,9%. E, embora na faixa etária de 16 a 24 anos a principal finalidade da navegação seja lazer – com foco em jogos e vídeos –, a partir dos 25 anos o que move o mouse é o trabalho e a busca de informações. Ou seja: são leitores eletrônicos que trocaram páginas por telas.

     – A plataforma muda, mas o hábito se mantém. Aliás, se parar para pensar, a gente acaba lendo muito mais. A busca de informações por profissionais e acadêmicos tem se deslocado para a internet, o que não é ruim. Como professor, tenho de indicar diversas fontes para alunos. Antes, era preciso comprar livros ou ir até uma biblioteca. Na internet, há muito mais fontes de consulta. O grande problema é filtrar e saber o que realmente vale a pena – avalia Celso Poderoso, economista mestre em Tecnologia e especialista em Sistemas de Informação, coordenador dos cursos de graduação tecnológica da Faculdade de Informática e Administração Paulista (Fiap).

     Como todo processo de transformação, esse também não é unânime.

    – A forma como as pessoas se dedicam à cultura online de fato encurta o tempo de pesquisa, mas é tamanha a quantidade de informação que a leitura passa a ser mais coletora do que analítica. Aprofundar temas fica mais difícil. Essa formatação da mente para um olhar mais dispersivo parece diminuir a capacidade de concentração para uma leitura mais prolongada – adverte João Carneiro, presidente da Câmara Riograndense do Livro (CRL).

     Por praticidade, o coordenador da especialização em Jornalismo Digital da PUCRS e consultor em novas mídias, Marcelo Träsel, diz preferir um livro a um computador para ler durante esperas em aeroportos.

     – É diferente ler em computador e no papel. O meio obriga a certas atitudes. Se a tela não for boa, não vou conseguir ler por muito tempo. Ainda não é possível avaliar totalmente as consequências cognitivas que a mudança de plataforma vai provocar. A discussão sobre o fim da privacidade de alguns anos provocada por blogs e fotoblogs em que se postava tudo evoluiu quando os jovens cresceram e passaram a buscar mais privacidade, e agora estão tirando do ar as fotos de festas.

POR MARTA SFREDO para Zero Hora
 
 
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