PORTUGUÊS E POESIA
MITOS E LENDAS DO SUL
Antonio Augusto Fagundes, tradicionalista
O que são mitos? O que são lendas? Por que o povo conta lendas e mitos?
Essas perguntas não são especiosas, ou gratuitas. Bem ao contrário: mitos e lendas são fundamentais para o aprofundamento na alma popular. Ninguém – mas absolutamente ninguém! – conhecerá um grupo social em profundidade sem intimar o seu folclore. Estudar mitos e lendas, portanto, é fundamental.
O folclore é aquela cultura espontânea, não-oficial, que flui paralela e obrigatoriamente à cultura oficial, dita erudita, ou escolástica. Trata-se de um complexo cultural altamente efetivo que se entranha em nós com tamanha naturalidade que não nos damos conta de sua força, a não ser quando tomamos deliberadamente consciência de sua presença.
O folclore nos confere um caráter político, nacional e regional. Em muitos países, o folclore foi fundamental para resistir à devastação de uma cultura pelos vencedores da guerra. O exemplo do Japão após a II Guerra Mundial é bem expressivo.
Os mitos e as lendas são a história do País (expressão aqui tomada em seu verdadeiro sentido) contada pelo seu povo. Enquanto o mito é universal, a lenda é local. O mito é atemporal, a lenda se localiza no tempo obrigatoriamente.
O povo conta mitos e lendas para fazer sua autobiografia, para relatar suas memórias. Trata-se de uma profunda e urgente necessidade de explicar-se. Os mitos e as lendas são assim um depoimento que o povo faz sobre si mesmo e para si mesmo. É como se estivesse diante do espelho. Trata-se, a rigor, de uma confissão, e a igreja descobriu a importância do confessionário muito antes que a psicanálise inventasse o divã do analista.
Gente importante nas Ciências Sociais, até mesmo folcloristas ilustres, confundem, às vezes, mitos e lendas. A confusão se explica, em parte, porque muitos mitos geram lendas locais e algumas lendas, como as etiológicas, são, em realidade, pequenos mitos. Há na lenda obrigatoriamente um caráter mágico, sobrenatural, que a distingue do conto tradicional, o causo galponeiro, tão comum no Sul. A única exceção, que existe para confirmar a regra, é a lenda do Tesouro do Menino-Diabo, que não aparece envolta em magia.
O Folclore é a ciência do amor, por isso eu me fiz folclorista.
Fonte: Zero Hora